Aprovada pela Câmara dos Deputados pouco antes do recesso parlamentar, a regulação do mercado de carbono no Brasil trará desafios nas áreas de investimento e de fiscalização. A proposta prevê que empresas que reduzem as próprias emissões podem adquirir créditos e vendê-los a quem não cumprir as cotas. Estudo da Câmara de Comércio Internacional (ICC-Brasil), organização que reúne integrantes da Câmara de Comércio Internacional, mostra que o Brasil tem potencial para movimentar US$ 120 bilhões (cerca de R$ 575 bilhões) até 2030.
Na visão de especialistas ouvidos pelo R7, serão necessárias estratégias de fiscalização para garantir a reputação dos créditos emitidos no país.
• Clique aqui e receba as notícias do R7 no seu WhatsApp
• Compartilhe esta notícia pelo WhatsApp
• Compartilhe esta notícia pelo Telegram
• Assine a newsletter R7 em Ponto
“No longo prazo, o Brasil precisa ter uma certificadora para a verificação da origem desses créditos, [para validar] se realmente houve a compensação no título emitido”, alerta o especialista em governança fundiária ambiental Richard Torsiano.
Para ele, também será necessário resolver os problemas históricos ligados às questões fundiárias, especialmente na Amazônia.
Isso porque, no mercado de carbono, o “produto” à venda é a remoção dos gases causadores do efeito estufa da atmosfera. Pela capacidade de produção de energia limpa e de reflorestamento, o Brasil tem vantagem perante outros países na geração de créditos.
Outro ponto de atenção, na visão de Torsiano, tem a ver com os incentivos a proprietários de terras que preservam a floresta. “Aqueles que já estão envolvidos com alguma atividade produtiva [devem ser incentivados] a manter a floresta em pé, cuidar e fiscalizar, assim trabalhando em prol da restauração e proteção da floresta”, afirma.
Pela proposta, as instalações em território nacional que emitirem mais de 10 mil toneladas de dióxido de carbono (CO₂) por ano ficariam sujeitas às regras do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Quem emitir acima de 25 mil toneladas de CO₂ teria tratamento mais rígido, com previsão de sanções e multas para o caso de descumprimento de metas.
O arranjo também prevê que as empresas que gerarem menos CO₂ poderão vender os créditos que acumularem para as companhias que não cumprem as cotas de emissão, transformando a redução da emissão de gases em faturamento.
4.000 instalações sujeitas ao mercado regulado
A estimativa do governo é que cerca de 4.000 instalações fiquem sujeitas ao mercado regulado, se considerado o recorte de emissões acima de 25 mil toneladas. Entram na conta segmentos da indústria, de energia, de resíduos e um residual de agro.
A relação do agronegócio com o mercado de crédito de carbono também despertou preocupação de alas ligadas ao meio ambiente. Durante a discussão na Câmara, a bancada ruralista conseguiu a exclusão do setor agrícola do sistema de metas de emissões no mercado de créditos de carbono, mesmo sendo o setor responsável por cerca de 75% das emissões brasileiras.
Mestre em engenharia de recursos naturais e consultor especialista em sustentabilidade, João Marcello Gomes Pinto afirma que há um acerto conceitual na questão na forma como “o agronegócio deve ser encarado no Brasil, sendo um solucionador das questões climáticas, e não um vilão”.
“Com a lei, deixamos de colocar o agro como um vilão, impondo metas de redução, mas o colocamos como potenciais geradores de crédito de carbono. Tendo uma agricultura mais eficiente, parte de terras sendo conservadas, os stakeholders enxergando valor em ter que adquirir e preservar áreas para terem uma remuneração equivalente. Tudo isso vai mudar a forma de utilização das terras no Brasil, além de trazer mais consciência sobre o desmatamento e a importância de deixar as florestas de pé. O PL [projeto de lei] traz uma nova commodity para dentro do agronegócio, que é a floresta de pé e a conservação da biodiversidade”, opina.
Texto de volta ao Senado
O projeto já foi aprovado no Senado, no entanto, como passou por mudanças na Câmara dos Deputados, precisará voltar à análise dos senadores. Os pontos ainda obscuros devem ser esclarecidos à medida que o mercado, de fato, começar a ser instrumentalizado e regulado. Isso deve ocorrer dentro dos próximos dois anos.
“O projeto de lei é um ponto de início e tem a capacidade de trazer para o Brasil esse protagonismo, acatando a sua vocação de solução em relação aos serviços ambientais baseados na natureza para o mundo. Isso insere o Brasil no mercado internacional”, finaliza João Marcello.